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Síntese

As perspetivas de curto prazo para a atividade económica na área do euro registaram uma deterioração acentuada e estão rodeadas de uma incerteza muito elevada. A pandemia de COVID-19, que eclodiu na China e se propagou recentemente a Itália e a outros países, representa um choque negativo significativo, que se espera venha a ter um forte impacto adverso na atividade da área do euro, pelo menos no curto prazo, afetando tanto a oferta como a procura. A deterioração da atividade na China e em outros países afetados implica um crescimento mais fraco das exportações da área do euro e perturbações nas cadeias de oferta mundiais. As recentes correções acentuadas nos mercados bolsistas mundiais deverão conduzir a uma deterioração da confiança dos consumidores e das empresas. Além disso, as rigorosas medidas de confinamento adotadas afetarão adversamente o lado da oferta da economia e terão também repercussões negativas consideráveis na procura, afetando certos setores de forma desproporcionada (por exemplo, o turismo, os transportes e os serviços recreativos e culturais).

O impacto total do choque da COVID-19 é, nesta fase, muito difícil de avaliar. Os especialistas do BCE concluíram as projeções de referência para a área do euro em 28 de fevereiro, tendo em conta a informação disponível na altura e com base em pressupostos com uma data de fecho da informação de 18 de fevereiro. No entanto, a informação disponibilizada ao longo do mês de março relativa a uma propagação mais rápida da COVID-19 na área do euro e a nível mundial, acompanhada de fortes descidas nos mercados financeiros e nos preços do petróleo, não é tida em conta nas projeções. Por conseguinte, as projeções estão rodeadas de riscos significativos em sentido descendente, especialmente no curto prazo. Além disso, a extensão, a gravidade e a duração das medidas de isolamento aumentam os riscos em sentido descendente para as perspetivas de curto prazo.

Embora a duração e a gravidade do surto de COVID-19 estejam rodeadas de elevada incerteza, a projeção de referência pressupõe que o vírus será contido nos próximos meses, permitindo uma normalização do crescimento no segundo semestre de 2020. Além do curto prazo, as condições de financiamento muito favoráveis, uma certa dissipação da incerteza a nível mundial, a recuperação gradual associada da procura externa e a considerável menor restritividade orçamental devem apoiar a retoma do crescimento. De um modo geral, projeta-se que o crescimento real do produto interno bruto (PIB) desça de 1,2% em 2019 para 0,8% em 2020, subindo depois para 1,3% em 2021 e 1,4 em 2022. Em comparação com as projeções de dezembro de 2019, o crescimento foi revisto em baixa em 0,3 pontos percentuais para 2020 e em 0,1 pontos percentuais para 2021, principalmente devido ao surto de COVID-19.

A inflação medida pelo Índice Harmonizado de Preços no Consumidor (IHPC) deverá diminuir ligeiramente, passando de 1,2% em 2019 para 1,1% em 2020, aumentando ao longo do restante horizonte de projeção para 1,6% em 2022. A queda do perfil da inflação medida pelo IHPC no decurso de 2020 reflete as taxas negativas da inflação da componente de produtos energéticos do IHPC, devido a descidas dos preços do petróleo até à data de fecho da informação, que, em parte, decorreram de receios no tocante às perspetivas mundiais devido à COVID-19. Além do impacto no preço do petróleo, as implicações da propagação da COVID-19 em matéria de inflação estão rodeadas de considerável incerteza. Pressupõe-se, nas projeções, que as pressões em sentido descendente sobre os preços relacionadas com a procura mais fraca em 2020 são, em grande medida, compensadas por efeitos em sentido ascendente relacionados com perturbações na oferta, embora esta avaliação esteja sujeita a claros riscos em sentido descendente. No médio prazo, a inflação medida pelo IHPC excluindo produtos energéticos e produtos alimentares deverá ser apoiada pela recuperação gradual da atividade, por um crescimento dos salários relativamente robusto num contexto de mercados de trabalho restritivos e pela recuperação das margens de lucro. Além disso, a subida dos preços das matérias-primas não energéticas e dos preços das importações deverá contribuir para o aumento da inflação medida pelo IHPC excluindo produtos energéticos e produtos alimentares. Em comparação com as projeções de dezembro de 2019, a projeção para a inflação medida pelo IHPC não foi revista[1].

No contexto de elevada incerteza em torno do impacto económico da pandemia de COVID-19, foram preparados cenários adversos baseados em modelos (ver a caixa 3). A concretização destes cenários implicaria, em comparação com as projeções de março de 2020, um crescimento mais baixo do PIB em 2020 entre 0,6 pontos percentuais e 1,4 pontos percentuais, enquanto a inflação seria inferior entre 0,2 pontos percentuais e 0,8 pontos percentuais, dependendo da gravidade do cenário e do modelo utilizados. Note-se que, nestes cenários, a política monetária e a política orçamental não reagem. A inclusão de reações destas políticas poderia atenuar significativamente os efeitos nestes cenários.

1 Economia real

O crescimento real do PIB na área do euro no quarto trimestre de 2019 situou-se em 0,1%, tendo sido mais fraco do que o esperado nas projeções de dezembro de 2019. Além dos fatores temporários, como os efeitos de calendário relacionados com as datas das férias de Natal e as greves em França, os resultados mais fracos refletiram sobretudo a continuação da fragilidade subjacente no setor da indústria transformadora, provavelmente devido a fatores adversos a nível mundial.

Gráfico 1

PIB real da área do euro

(variação em termos trimestrais em cadeia, em percentagem; dados trimestrais corrigidos de sazonalidade e de dias úteis)

Notas: Os intervalos em torno das projeções baseiam-se nas diferenças entre resultados observados e projeções anteriores elaboradas ao longo de diversos anos. A amplitude dos intervalos é igual ao dobro do valor absoluto médio dessas diferenças. O método utilizado no cálculo dos intervalos, que envolve a correção de acontecimentos excecionais, encontra-se descrito num documento sobre o novo procedimento para a construção de intervalos nas projeções elaboradas por especialistas do Eurosistema e do BCE (New procedure for constructing Eurosystem and ECB staff projection ranges), publicado em dezembro de 2009 e disponível (apenas em língua inglesa) no sítio do BCE.

Os indicadores de sentimento nos vários setores – baseados em inquéritos realizados antes do recente surto de COVID-19 na área do euro – melhoraram em janeiro e fevereiro de 2020, refletindo provavelmente alguma dissipação das incertezas a nível mundial. O indicador de sentimento económico compilado pela Comissão Europeia continuou a melhorar, partindo de um nível muito inferior à sua média de longo prazo para um nível próximo da mesma. A confiança dos consumidores melhorou de forma significativa em fevereiro, após ter permanecido inalterada em janeiro, e superou a sua média de longo prazo. Os índices de gestores de compras também melhoraram nos dois primeiros meses de 2020, tendo os dados para a indústria transformadora aumentado para valores ligeiramente abaixo do limiar de crescimento de 50, enquanto os índices relacionados com os setores dos serviços e da construção se mantêm acima de 50. De um modo geral, os indicadores mais recentes, baseados em inquéritos realizados antes do recente surto de COVID-19 na área do euro, teriam sugerido uma ligeira retoma do crescimento no primeiro semestre de 2020.

Não obstante os sinais bastante favoráveis dos indicadores de sentimento disponíveis no final de fevereiro, o impacto do surto de COVID-19 implica um crescimento muito fraco no curto prazo. Uma menor procura de importações provenientes da China, amplificada por perturbações nas cadeias de oferta mundiais, e, mais importante ainda, os surtos mais recentes em Itália e em outros países da área do euro deverão prosseguir nos próximos meses antes que o vírus seja contido. Consequentemente, a atividade no primeiro semestre de 2020 será afetada não só devido ao impacto de medidas de confinamento rigorosas (tais como o encerramento temporário de fábricas, as restrições de viagens e o cancelamento de manifestações de massa e de grandes eventos), mas também por força de um impacto negativo esperado na confiança. De um ponto de vista setorial, os serviços – em especial, o turismo, os transportes e os serviços recreativos e culturais – deverão ser particularmente afetados. A continuação da fragilidade subjacente na indústria transformadora, tal como observado em finais de 2019, irá igualmente travar a atividade no início de 2020. Espera-se que o crescimento recupere a partir do segundo semestre de 2020, com base no pressuposto de que a pandemia de COVID-19 será contida.

No médio prazo, a projeção de referência pressupõe uma dissipação gradual dos fatores adversos a nível mundial, permitindo aos fatores fundamentais que apoiam a expansão da área do euro ganhar força (ver o gráfico 1 e o quadro 1). A projeção de referência pressupõe, em particular, a conclusão de um acordo sobre as futuras relações comerciais entre a União Europeia e o Reino Unido até ao final de 2020 e a não adoção de mais medidas de protecionismo comercial a nível mundial (para além das já anunciadas). Por conseguinte, o atual nível de incerteza em termos de políticas na esfera mundial diminuirá gradualmente, permitindo aos fundamentos que impulsionam o crescimento ganhar força e apoiar a atividade em 2021 e 2022. As condições de financiamento deverão manter-se muito acomodatícias e as medidas de política monetária do BCE continuarão a ser transmitidas à economia. Mais especificamente, os pressupostos técnicos implicam que, ao longo do horizonte de projeção, as taxas de juro nominais de longo prazo registam apenas um aumento modesto face aos mínimos históricos atuais. O crescimento do consumo privado e do investimento residencial deverá também beneficiar da subida relativamente robusta dos salários. Espera-se que as exportações da área do euro beneficiem da projetada retoma da procura externa. Por último, a expetativa é de que a orientação orçamental se torne menos restritiva no período de 2020 e 2021 (ver a secção 3).

No entanto, o desvanecimento de alguns fatores favoráveis deverá reduzir o dinamismo do crescimento perto do final do horizonte de projeção. Espera-se que o crescimento da população ativa abrande, refletindo sobretudo restrições da oferta de mão de obra, em parte relacionadas com fatores demográficos, em alguns países. Além disso, após vários anos de política orçamental expansionista, a orientação orçamental da área do euro deverá passar a ser globalmente neutra em 2022.

Quadro 1

Projeções macroeconómicas para a área do euro

(variação anual, em percentagem)

Notas: O PIB real e as suas componentes, os custos unitários do trabalho, a remuneração por trabalhador e a produtividade do trabalho têm por base dados corrigidos de sazonalidade e de dias úteis.
1) Os intervalos em torno das projeções baseiam-se nas diferenças entre resultados observados e projeções anteriores elaboradas ao longo de diversos anos. A amplitude dos intervalos é igual ao dobro do valor absoluto médio dessas diferenças. O método utilizado no cálculo dos intervalos, que envolve a correção de acontecimentos excecionais, encontra-se descrito num documento sobre o novo procedimento para a construção de intervalos nas projeções elaboradas por especialistas do Eurosistema e do BCE (New procedure for constructing Eurosystem and ECB staff projection ranges), publicado em dezembro de 2009 e disponível (apenas em língua inglesa) no sítio do BCE.
2) Incluindo comércio intra-área do euro.

3) O subíndice tem por base estimativas do impacto efetivo dos impostos indiretos. Tal poderá diferir dos dados do Eurostat, que assentam no pressuposto de uma transmissão integral e imediata dos efeitos fiscais ao IHPC.
4) Calculado como o saldo orçamental das administrações públicas líquido de efeitos transitórios do ciclo económico e de medidas temporárias tomadas pelos governos.

Analisando em mais pormenor as componentes do crescimento do PIB, espera-se que o crescimento do consumo privado seja relativamente resiliente durante o horizonte de projeção. No curto prazo, não obstante a prossecução do crescimento dos salários reais e os efeitos positivos da menor restritividade orçamental em alguns países, o impacto esperado da COVID-19 e uma provável diminuição da confiança deverão conduzir a uma subida do rácio de poupança e, por conseguinte, a perspetivas mais fracas para o consumo privado do que o anteriormente esperado. Durante o horizonte de projeção, o crescimento do consumo privado deverá ser apoiado por condições de financiamento favoráveis e pelo crescimento dos salários em curso. De acordo com as projeções, as taxas ativas nominais dos bancos deverão registar uma nova descida ligeira em 2020, aumentando depois modestamente em 2021 e 2022. Dado projetar-se que as taxas ativas bancárias e os volumes de empréstimos bancários às famílias subam apenas moderadamente nos próximos anos, espera-se que os pagamentos de juros brutos se mantenham em níveis baixos e, portanto, continuem a apoiar o consumo privado.

Caixa 1
Pressupostos técnicos sobre taxas de juro, taxas de câmbio e preços das matérias-primas

Em comparação com as projeções de dezembro de 2019, os pressupostos técnicos incluem preços do petróleo mais baixos, uma taxa de câmbio efetiva do euro mais fraca e taxas de juro de longo prazo mais reduzidas. Os pressupostos técnicos relativos às taxas de juro e aos preços das matérias-primas têm por base as expetativas do mercado, com uma data de fecho da informação de 18 de fevereiro de 2019. As taxas de curto prazo referem-se à EURIBOR a três meses, sendo as expetativas do mercado determinadas a partir das taxas dos contratos de futuros. Seguindo esta metodologia, obtém-se para estas taxas de juro de curto prazo um nível médio de -0,4% ao longo de todo o horizonte de projeção. As expetativas do mercado quanto às taxas de rendibilidade nominais das obrigações de dívida pública a dez anos na área do euro implicam um nível médio de 0,1% em 2020, 0,2% em 2021 e 0,3% em 2022[2]. Em comparação com as projeções de dezembro de 2019, as expetativas do mercado em relação às taxas de juro de curto prazo foram objeto de uma revisão em baixa de cerca de 10 pontos base para 2022, ao passo que as taxas de rendibilidade nominais das obrigações de dívida pública a dez anos na área do euro foram revistas em baixa em torno de 20 pontos base de 2020 a 2022.

No que respeita aos preços das matérias-primas, com base na trajetória implícita nos mercados de futuros e considerando a média da quinzena finda na data de fecho da informação de 18 de fevereiro de 2020, o pressuposto é de que o preço do barril de petróleo bruto Brent diminua de USD 64,0 em 2019 para USD 56,4 em 2020 e que desça para USD 55,4 em 2022. Esta trajetória implica que, em comparação com as projeções de dezembro de 2019, os preços do petróleo em dólares dos Estados Unidos são mais baixos ao longo do todo o horizonte de projeção. Quanto aos preços em dólares dos Estados Unidos das matérias-primas não energéticas, estima-se que tenham descido em 2019, mas pressupõe-se que recuperem nos anos subsequentes.

Relativamente às taxas de câmbio bilaterais, parte-se do pressuposto de que, durante o horizonte de projeção, permanecerão inalteradas nos níveis médios prevalecentes no período de duas semanas findo em 18 de fevereiro de 2020, a data de fecho da informação. Tal implica uma taxa de câmbio média de USD 1,09 por euro no período de 2020 a 2022, a qual é ligeiramente mais baixa do que a indicada nas projeções de dezembro de 2019. A taxa de câmbio efetiva do euro (face a 38 parceiros comerciais) registou uma depreciação de 1,1% desde as projeções de dezembro de 2019. A fragilidade do euro é generalizada, dado que o euro sofreu uma depreciação face a todas as principais moedas.

Pressupostos técnicos

A recente evolução dos mercados desde a data de fecho da informação implicaria uma revisão significativa dos pressupostos técnicos: o euro registou uma apreciação, ao passo que os mercados financeiros e os preços do petróleo apresentaram fortes descidas, refletindo, entre outros aspetos, a propagação da COVID-19. O euro registou recentemente um fortalecimento face ao dólar dos Estados Unidos, na sequência da redução inesperada da taxa de juro pela Reserva Federal. Nos mercados de dívida soberana, as taxas de rendibilidade de certos instrumentos de dívida (como as obrigações de dívida pública alemãs a dez anos) registaram fortes descidas, espelhando uma combinação de preocupações em relação ao crescimento e fuga para a segurança, enquanto o diferencial face às taxas de rendibilidade correspondentes em outros países da área do euro se alargou de forma significativa. Ao mesmo tempo, o preço do petróleo registou uma forte diminuição, refletindo não só a intensificação dos receios quanto às implicações da propagação da COVID-19 em termos de crescimento mundial, mas também os recentes desentendimentos entre os participantes da OPEP+.

Tendo em conta estes desenvolvimentos, os modelos macroeconómicos elaborados pelos especialistas foram utilizados para fornecer estimativas mecânicas do impacto, no crescimento e na inflação, das alterações dos pressupostos em relação aos preços do petróleo e à taxa de câmbio entre a data de fecho da informação para os pressupostos técnicos (18 de fevereiro) e 9 de março (considerando a média dos dez dias úteis até essa data e incluindo a mesma). As estimativas mecânicas a seguir apresentadas constituem uma indicação da ordem de grandeza com que a evolução mais recente dos preços do petróleo e da taxa de câmbio pode afetar os riscos em torno das projeções. No entanto, estas estimativas mecânicas não devem ser interpretadas como constituindo uma alternativa às projeções apresentadas no resto desta publicação.

1) Impacto mecânico de uma trajetória atualizada para os preços do petróleo

Os preços dos futuros do petróleo baseados na média dos dez dias úteis até 9 de março, inclusive, situaram-se em USD 49,4 por barril no segundo trimestre de 2020, ou seja, 13,1% abaixo do pressuposto na projeção de referência para esse trimestre. Posteriormente, os preços dos futuros do petróleo, a partir de 9 de março de 2020, apresentam uma subida gradual para USD 52,7 por barril em 2022, valor que é 5,2% inferior ao pressuposto na projeção de referência para esse ano. Utilizando a média dos resultados dos modelos macroeconómicos elaborados pelos especialistas, esta trajetória teria um impacto ascendente marginal no crescimento real do PIB em 2020 e 2021, ao passo que a inflação medida pelo IHPC seria 0,3 pontos percentuais mais baixa em 2020, ligeiramente mais baixa em 2021 e 0,1 pontos percentuais mais alta em 2022.

2) Impacto mecânico de uma trajetória atualizada para a taxa de câmbio do euro

No que diz respeito à taxa de câmbio do euro, a projeção de referência pressupõe uma taxa de câmbio de USD 1,09 por euro. A taxa de câmbio média dos dez dias úteis até 9 de março, inclusive, foi de USD 1,11 por euro, ou seja, 1,7% acima do pressuposto na projeção de referência. O euro registou também uma apreciação face a outras moedas importantes, o que implica que a taxa de câmbio efetiva nominal do euro aumentou 2,0% desde a data de fecho da informação para a projeção de referência. Utilizando a média dos resultados dos modelos macroeconómicos elaborados pelos especialistas, o crescimento real do PIB sofreria uma atenuação de cerca de 0,1 pontos percentuais em 2020 e 2021, enquanto a inflação medida pelo IHPC seria 0,1 pontos percentuais mais baixa de 2020 a 2022.

O crescimento do investimento residencial deverá prosseguir, ainda que a um ritmo mais moderado. No curto prazo, o esperado impacto negativo do surto de COVID-19 na confiança, aliado a um abrandamento do número de licenças de construção concedidas, aponta para uma moderação da expansão do investimento em habitação nos próximos trimestres. Projeta-se que o crescimento do investimento em habitação permaneça moderado em 2021 e 2022, visto que as tendências demográficas adversas em alguns países deverão travar o investimento em habitação.

O investimento empresarial deverá permanecer reduzido no curto prazo, antes de ganhar gradualmente dinamismo no decurso do horizonte de projeção. O investimento empresarial será fraco no primeiro semestre de 2020. Os efeitos cíclicos adversos associados à fraca procura externa, à elevada incerteza em termos de políticas, sobretudo no setor da indústria transformadora orientado para as exportações, e ao impacto negativo do surto de COVID-19 deverão resultar numa taxa de crescimento consideravelmente fraca do investimento empresarial em 2020, o que implica uma revisão em baixa significativa em comparação com as projeções de dezembro de 2019. Após 2020, porém, como se pressupõe uma dissipação da incerteza, espera-se que diversos fundamentos favoráveis apoiem o investimento empresarial. Em primeiro lugar, à medida que a atividade económica recupera, as empresas irão reforçar o investimento para que o seu stock de capital produtivo se expanda e acompanhe a procura. Em segundo lugar, as condições de financiamento deverão manter-se muito favoráveis ao longo do horizonte de projeção. Em terceiro lugar, espera-se que as margens de lucro melhorem, o que deverá apoiar o crescimento do investimento. Por último, o rácio de alavancagem das sociedades não financeiras diminuiu nos últimos anos e os pagamentos de juros brutos das mesmas desceram para níveis historicamente baixos.

Caixa 2
Enquadramento internacional

As projeções internacionais foram concluídas em 18 de fevereiro, antes da propagação mundial da COVID-19 para fora da China e da subsequente reação dos mercados financeiros. A presente caixa começa por descrever as projeções internacionais incluídas na projeção de referência. Analisa, em seguida, os desenvolvimentos mais recentes desde a data de fecho da informação e as suas possíveis implicações.

a) Perspetivas a nível mundial (com uma data de fecho da informação de 18 de fevereiro)

Em 2019, o crescimento real do PIB mundial (excluindo a área do euro) diminuiu para 2,9%, o seu ritmo mais lento desde a Grande Recessão. Este abrandamento foi bastante generalizado, uma vez que a produção na indústria transformadora a nível mundial diminuiu de forma acentuada no contexto de um aumento da incerteza mundial resultante da escalada recorrente das tensões comerciais, que levou as empresas a adiar o investimento e os consumidores a adiar a aquisição de bens duradouros. Além disso, várias economias emergentes foram atingidas por choques idiossincráticos, que acentuaram ainda mais a desaceleração da atividade mundial no ano passado. Ao mesmo tempo, várias das principais economias avançadas e emergentes lançaram políticas de estímulo da procura, limitando, assim, o ritmo e a profundidade do abrandamento do crescimento mundial.

O abrandamento do comércio mundial foi ainda mais pronunciado. O crescimento anual das importações mundiais (excluindo a área do euro) diminuiu para 0,3% em 2019, situando-se significativamente abaixo do valor de 4,6% registado no ano precedente. Uma confluência de fatores negativos moldou esta evolução, incluindo o aumento do protecionismo – que agudizou a incerteza comercial – e uma viragem no ciclo tecnológico mundial, que pesou especialmente nas economias asiáticas estreitamente integradas através de cadeias de oferta.

Na viragem do ano, surgiram sinais de estabilização na atividade e no comércio. De acordo com as projeções, a atividade mundial atingiria o seu nível mínimo no terceiro trimestre de 2019, o que foi amplamente confirmado pelos dados. A informação disponível relativa ao quarto trimestre corroborou a perspetiva de que a atividade mundial estava a estabilizar em níveis bastante modestos, tal como incorporado nas projeções de dezembro de 2019. Todavia, o crescimento das importações mundiais e da procura externa da área do euro revelou-se muito mais forte no segundo semestre de 2019 do que o esperado nas projeções de dezembro de 2019, devido, em grande medida, ao dinamismo do crescimento das importações em economias emergentes importantes, em especial na China e na Turquia. Os dados de inquéritos, disponíveis na altura em que as projeções foram elaboradas, proporcionaram mais evidência de que a atividade mundial atingira o seu nível mínimo, visto que o Índice de Gestores de Compras (IGC) mundial compósito do produto (excluindo a área do euro) aumentou em janeiro de 2020, apoiado por melhores leituras tanto para o setor da indústria transformadora como para o setor dos serviços. Além disso, a conclusão do acordo comercial “Fase I” entre os Estados Unidos e a China proporcionou algum alívio nas tensões comerciais, uma vez que ambos os países reduziram as tarifas no seu comércio bilateral e a China comprometeu-se a adquirir um valor substancial de bens e serviços dos Estados Unidos nos próximos dois anos. Esta redução parcial das tensões comerciais também apoiou os preços das ações, que contribuíram igualmente para condições de financiamento mais favoráveis nas economias avançadas e nos mercados emergentes.

A projeção de referência para as perspetivas a nível mundial, concluída em 18 de fevereiro, indicou que o surto de COVID-19 conduziria a um ligeiro atraso na recuperação da atividade mundial. Na data de fecho da informação para as projeções de março de 2020 no tocante ao enquadramento internacional (18 de fevereiro de 2020), a projeção de referência partia do pressuposto de que o surto prevalecente reduziria em 1,5 pontos percentuais o crescimento real trimestral do PIB na China no primeiro trimestre de 2020, seguindo-se uma retoma no segundo e terceiro trimestres, uma vez que se esperava um regresso da produção aos níveis normais. Estas projeções basearam-se no pressuposto assumido na altura de que o surto de COVID-19 se limitaria, em grande medida, à China e a rápida queda das novas taxas de infeção implicaria apenas perturbações temporárias – embora significativas – da atividade económica na China.

A expetativa é de que a recuperação a nível mundial ganhe apenas uma força modesta. Projeta-se que o crescimento da atividade mundial (excluindo a área do euro) seja de 3,1% este ano, isto é, ligeiramente acima da estimativa de 2,9% para 2019. No médio prazo, projeta-se que o crescimento mundial registe um ligeiro aumento – situando-se em 3,5% e 3,4% em 2021 e 2022, respetivamente –, mantendo-se, porém, abaixo da sua média de longo prazo de 3,8%. A retoma gradual do crescimento mundial no médio prazo depende da recuperação projetada para várias economias emergentes, as quais deverão recuperar gradualmente de recessões recentes ou de abrandamentos acentuados do crescimento. No entanto, a trajetória de recuperação para este grupo de economias emergentes permanece frágil, devido a fatores adversos externos, os quais, a par da instabilidade política a nível interno, podem pôr em causa as perspetivas de retoma.

Enquadramento internacional

(variação anual, em percentagem)

1) Calculado como uma média ponderada das importações.
2) Calculada como uma média ponderada das importações dos parceiros comerciais da área do euro.

As perspetivas de médio prazo relativas ao comércio mundial permanecem fracas face aos padrões históricos, dado esperar-se que a elasticidade do comércio em relação ao rendimento se mantenha abaixo da unidade, o seu “novo normal”[3]. Tal reflete uma confluência de fatores, incluindo tarifas aduaneiras superiores às aplicadas até à data e uma elevada incerteza em termos de políticas. Espera-se que o crescimento das importações mundiais (excluindo a área do euro) aumente de forma gradual, passando de 0,3% em 2019 para 1,4% em 2020, acelerando depois para 2,6% em 2021 e 2,7% em 2022. De acordo com as projeções, a procura externa da área do euro aumentará 1,6% no presente ano, antes de acelerar para 2,5% e 2,6% em 2021 e 2022, respetivamente. Em comparação com as projeções de dezembro de 2019, a procura externa da área do euro foi revista em alta no tocante a 2020. Contudo, esta revisão está relacionada sobretudo com os efeitos de repercussão estatística de surpresas motivadas por dados em sentido ascendente no segundo semestre de 2019 e, numa escala limitada, com o aumento das importações bilaterais entre os Estados Unidos e a China resultante da redução das tarifas no contexto do acordo comercial “Fase I”. No entanto, como o acordo comercial apoia essencialmente o comércio bilateral entre os dois países, é provável que os benefícios para as exportações da área do euro sejam limitados. Na verdade, os efeitos do desvio dos fluxos comerciais podem mesmo vir a pesar sobre as exportações da área do euro. Numa análise para além do impacto destes fatores, a projeção para a procura externa da área do euro mantém-se, em geral, inalterada face às projeções de dezembro de 2019.

b) Desenvolvimentos relacionados com o surto de COVID-19 a nível mundial desde a data de fecho da informação para a finalização das projeções globais

O surto de COVID-19 ainda está em curso e o seu impacto geográfico e económico está a evoluir rapidamente. Embora, como acima explicado, à data de fecho da informação para as projeções internacionais (18 de fevereiro de 2020), o surto de COVID-19 tenha sido considerado, em larga medida, limitado à China continental, tornou-se evidente, durante as semanas seguintes, que já tinham começado a materializar-se riscos acentuados em sentido descendente relacionados com a extensão, a gravidade e a dispersão geográfica da pandemia em curso.

Dados recentes sobre a China apontam para riscos consideráveis em sentido descendente no tocante às projeções para a atividade e o comércio deste país. O IGC global para o setor da indústria transformadora na China do respetivo Instituto Nacional de Estatística registou uma descida pronunciada para 35,7 em fevereiro, face a 50,0 no mês anterior, o que representa a maior queda mensal desde o início do inquérito, em 2005. Além disso, o IGC para a atividade económica nos setores excluindo a indústria transformadora diminuiu de 54,1 em janeiro para 29,6 em fevereiro, um nível muito inferior ao registado durante a Grande Recessão. Estes valores do IGC indicam contrações acentuadas nos principais segmentos da economia chinesa. Tal deve-se, em parte, à prorrogação do encerramento de empresas após o Ano Novo chinês, no início de fevereiro, e a restrições em matéria de viagens e transportes nas províncias da China. Embora, em muitas regiões da China, tenha sido autorizado o reinício da atividade das empresas durante o mês de fevereiro, as dificuldades logísticas e operacionais atrasaram a normalização dos níveis de produção. Estes atrasos na produção, se prolongados, induzirão riscos de perturbações nas cadeias de oferta mundiais. Os indicadores de elevada frequência, nomeadamente o consumo diário de carvão dos principais produtores de eletricidade e os dados sobre o congestionamento do tráfego, entre outros, sugerem que, no início de março, a atividade económica se manteve significativamente abaixo dos níveis comparáveis em anos anteriores. Em geral, no primeiro trimestre, os dados apontam para um impacto económico da COVID-19 na China mais grave e persistente do que o previsto na projeção de referência de março de 2020 à data de fecho da informação para as projeções internacionais, em 18 de fevereiro. Por último, a diminuição da procura interna na China também tem repercussões negativas sobre os seus parceiros comerciais.

Desde finais de fevereiro, o surto de COVID-19 alastrou significativamente fora da China. No início de março, o vírus tinha-se propagado a mais de 80 países. Países geograficamente dispersos como a Coreia do Sul, o Irão e a Itália enfrentavam surtos independentes significativos. Um número crescente de países está a tomar medidas rigorosas para conter a propagação do vírus, que terá um impacto considerável na atividade económica desses países e possíveis repercussões nas cadeias de valor mundiais. Ao mesmo tempo, estão cada vez mais a ser tomadas medidas de política económica para compensar o impacto negativo da pandemia no crescimento, incluindo a redução da restritividade da política monetária pelo Sistema de Reserva Federal dos Estados Unidos e pelo Bank of England.

De um modo geral, o impacto mais adverso e mais duradouro do que o previsto da COVID-19 na China e uma propagação muito mais rápida do vírus a nível mundial apontam claramente para riscos em sentido descendente para as projeções relativas às perspetivas mundiais. O impacto do surto de COVID-19 na atividade e no comércio mundiais é significativamente mais adverso do que o previsto em meados de fevereiro. Esta deterioração das perspetivas para a atividade e o comércio mundiais refletiu-se, em parte, na projeção de referência para a área do euro, através de juízos técnicos.

De acordo com as projeções, o crescimento das exportações da área do euro deverá permanecer moderado no primeiro semestre de 2020 e registar um fortalecimento gradual ao longo do restante horizonte de projeção. Projeta-se que o crescimento das exportações seja particularmente fraco no primeiro semestre de 2020, em resultado da diminuição da procura na China e em outras economias asiáticas, bem como das perturbações do lado da oferta provocadas pelo surto de COVID-19. Além do impacto direto do surto de COVID-19 nas viagens e nos serviços de transportes, o comércio também deverá ser afetado por perturbações nas cadeias de oferta nacionais e internacionais. Projeta-se uma recuperação do comércio no segundo semestre deste ano e uma melhoria do ritmo de expansão das exportações, em consonância com a trajetória da procura externa (ver a caixa 2), o que implica quotas de mercado das exportações globalmente estáveis durante o horizonte de projeção. De um modo geral, o contributo do comércio líquido para o crescimento real do PIB deverá ser globalmente neutro ao longo do horizonte de projeção.

Segundo as projeções, o crescimento do emprego deverá ser moderado no decurso de 2020, refletindo, em grande medida, a atividade bastante fraca no curto prazo. O crescimento do emprego registará uma recuperação no decurso de 2021, à medida que a atividade ganha dinamismo. Projeta-se que, no médio prazo, o crescimento do emprego na área do euro permaneça fraco, uma vez que a oferta de mão de obra deverá limitar a expansão do emprego.

O crescimento da população ativa deverá apresentar uma moderação ao longo do horizonte de projeção. Espera-se que a população ativa continue a expandir-se, refletindo os projetados valores líquidos da imigração de trabalhadores (incluindo a esperada integração de refugiados) e os aumentos em curso da taxa de participação. No entanto, projeta-se que estes fatores se desvaneçam durante o horizonte de projeção e espera-se que o impacto adverso no crescimento da população ativa decorrente do envelhecimento da população aumente, em virtude de as gerações mais velhas deixarem de integrar a população ativa em números superiores aos das gerações mais jovens que passam a integrá-la.

No que respeita à taxa de desemprego, espera-se que registe um ligeiro aumento no decurso de 2020, permanecendo depois, em geral, estável durante o restante horizonte de projeção, situando-se em torno de 7½%. A heterogeneidade dos mercados de trabalho continuará a persistir, dado esperar-se que as taxas de desemprego continuem a apresentar diferenças substanciais em 2022 entre os países da área do euro.

Projeta-se uma retoma do crescimento da produtividade do trabalho ao longo do horizonte de projeção. Dado esperar-se que o surto de COVID-19 afete mais negativamente o crescimento do que o emprego, a produtividade do trabalho deverá ser muito moderada no primeiro semestre de 2020. Durante o resto do horizonte, o crescimento da produtividade deverá subir, à medida que a atividade ganha dinamismo, ao passo que o crescimento do fator trabalho deverá abrandar. Em 2022, o crescimento da produtividade do trabalho por pessoa empregada deverá exceder ligeiramente a sua média anterior à crise de 1,0%[4].

Em comparação com as projeções de dezembro de 2019, o crescimento real do PIB foi objeto de uma revisão em baixa de 0,3 pontos percentuais para 2020 e de 0,1 pontos percentuais para 2021. A revisão em baixa da atividade no tocante a 2020 reflete um pequeno efeito de repercussão dos resultados mais fracos do que o esperado para o crescimento no quarto trimestre de 2019, uma debilidade mais prolongada do que o anteriormente esperado no setor da indústria transformadora e, nomeadamente, o impacto negativo esperado do surto de COVID-19. O menor crescimento em 2020 implica um certo efeito de repercussão negativo em 2021.

Caixa 3
Análise de cenários: impactos na economia da área do euro decorrentes de uma intensificação da pandemia de COVID-19, tanto a nível mundial como na área do euro

No contexto de elevada incerteza em torno do impacto económico da pandemia de COVID-19, esta caixa apresenta dois cenários em caso de uma intensificação da crise para além do considerado na atual projeção de referência. O primeiro é um cenário “moderado” e tem em conta as implicações de um surto de COVID-19 mais persistente na China e na área do euro. O segundo é um cenário “grave”, assente no primeiro, mas com alguns choques adicionais nos mercados financeiros e nos preços do petróleo. Ambos os cenários são avaliados utilizando dois modelos macroeconómicos fundamentais do BCE[5].

Em ambos os cenários, a epidemia na China estende-se ao segundo trimestre de 2020. Consequentemente, a recuperação é adiada para o segundo semestre do ano, dando origem a perturbações significativas nas cadeias de oferta mundiais. Esta situação contrasta com a projeção de referência para a China, na qual se pressupõe que o surto atingirá o seu pico no primeiro trimestre de 2020, de modo que a queda do crescimento económico se concentra no primeiro trimestre de 2020 e a economia recupera a partir do segundo trimestre. O cenário implica igualmente importações substancialmente mais baixas do que o previsto na projeção de referência para o primeiro trimestre de 2020. Além disso, as perturbações nas cadeias de oferta conduzirão a um choque adicional na oferta na China, que aumentará a inflação global medida pelo índice de preços no consumidor (IPC). Pressupõe-se também que o esforço prolongado no sentido de conter a epidemia tenha efeitos adversos na confiança, aumente a incerteza e resulte numa subida dos prémios de risco na China. De um modo geral, as perspetivas globais mais fracas para a China e para outras economias mundiais implicam uma diminuição da procura externa da área do euro (de 0,3% em 2020) e uma descida dos preços do petróleo (de 14%).

Pressupõe-se, além disso, em ambos os cenários, que a propagação da COVID-19 na área do euro aumente significativamente. Para captar este efeito, pressupôs-se uma série de choques adversos específicos para a área do euro. Os mercados financeiros reagem negativamente à deterioração da situação, provocando uma subida repentina dos prémios de risco (de 20 pontos base) e afetando negativamente as condições de financiamento das empresas e das famílias. Um choque do lado da oferta reflete perturbações potenciais nas cadeias de oferta. Além disso, foram aplicados choques para refletir os impactos negativos do surto de COVID-19 no emprego, no turismo e nas despesas com viagens na área do euro, bem como no consumo de serviços de transporte e serviços recreativos e culturais.

No cenário grave, são acrescentados choques financeiros suplementares, a par de uma nova descida do preço do petróleo. O cenário grave incorpora os mesmos choques que o cenário moderado, complementando-os com um aumento adicional das margens de crédito (de 80 pontos base em 2020), uma diminuição de 10% tanto dos preços das ações como do património habitacional e uma queda adicional dos preços do petróleo (de 20%).

No cenário moderado, em comparação com as projeções de março de 2020, o impacto negativo no crescimento do PIB da área do euro situar-se-ia entre 0,6 e 0,8 pontos percentuais em 2020. O impacto da inflação seria inferior em cerca de 0,2 pontos percentuais, uma vez que os impactos em sentido descendente decorrentes sobretudo de descidas dos preços do petróleo são parcialmente compensados pelo impacto em sentido ascendente dos choques do lado da oferta.

No cenário grave, em comparação com as projeções de março de 2020, o impacto negativo no crescimento do PIB da área do euro situar-se-ia entre 0,8 e 1,4 pontos percentuais em 2020, ao passo que a inflação seria entre 0,4 e 0,8 pontos percentuais mais baixa no mesmo ano. O maior enfraquecimento da atividade económica real neste cenário é impulsionado principalmente pelo forte alargamento das margens de crédito e pela deterioração da riqueza financeira. Embora o pressuposto aumento das tensões financeiras tenha apenas efeitos marginais na inflação, a queda deste indicador reflete, em grande medida, a forte queda permanente do preço do petróleo.

De notar que, em ambos os cenários, se pressupõe uma não reação da política monetária e orçamental. A inclusão dessas reações de política poderia atenuar significativamente os efeitos nos dois cenários.

2 Preços e custos

A inflação medida pelo IHPC deverá diminuir ligeiramente, passando de 1,2% em 2019 para 1,1% em 2020, refletindo os efeitos atenuantes dos preços dos produtos energéticos, e aumentar depois gradualmente para 1,6% em 2022 (ver o gráfico 2). A taxa de inflação global mais fraca em 2020, em comparação com 2019, reflete uma descida significativa dos preços dos produtos energéticos do IHPC, tendo em conta a fraca evolução dos preços do petróleo (até à data de fecho da informação para os pressupostos técnicos), devido, em parte, ao surto de COVID-19. A inflação da componente de produtos energéticos do IHPC deverá permanecer negativa ao longo do ano e só passará a ser positiva no segundo trimestre de 2021, à medida que a curva de preços dos futuros do petróleo passa a ser horizontal e também em virtude de alguns efeitos em sentido ascendente decorrentes de aumentos dos impostos indiretos sobre os produtos energéticos. Embora o impacto das perspetivas mais fracas para a procura relacionadas com o surto de COVID-19 deva também exercer pressão em sentido descendente sobre os preços dos bens não energéticos, espera-se que esta situação seja largamente compensada por efeitos em sentido ascendente relacionados com perturbações na oferta. Parte-se do pressuposto de que a evolução dos preços das matérias-primas alimentares continuará a contribuir para a inflação da componente de produtos alimentares do IHPC, mas o efeito diminui de forma gradual ao longo do horizonte de projeção, o que implica um perfil ligeiramente descendente da inflação da componente de produtos alimentares do IHPC a partir de meados de 2020. Espera-se que a inflação medida pelo IHPC excluindo produtos energéticos e produtos alimentares oscile em torno de 1,2% – 1,3% no decurso de 2020 e registe um fortalecimento gradual, situando-se em 1,4% em 2021 e 1,5% em 2022. No plano interno, espera-se que a recuperação prevista da atividade apoie o fortalecimento da inflação medida pelo IHPC excluindo produtos energéticos e produtos alimentares ao longo do horizonte de projeção. A retoma desta medida da inflação será também apoiada por um crescimento salarial relativamente robusto e por uma recuperação das margens de lucro. Na vertente externa, a subida dos preços das matérias-primas não energéticas e dos preços das importações deverá contribuir para o reforço previsto da inflação medida pelo IHPC excluindo produtos energéticos e produtos alimentares durante o horizonte de projeção.

Gráfico 2

IHPC da área do euro

(variação homóloga, em percentagem)

Notas: Os intervalos em torno das principais projeções têm por base as diferenças entre resultados observados e projeções anteriores elaboradas ao longo de diversos anos. A amplitude dos intervalos é igual ao dobro do valor absoluto médio dessas diferenças. O método utilizado no cálculo dos intervalos, que envolve a correção de acontecimentos excecionais, encontra-se descrito num documento sobre o novo procedimento para a construção de intervalos nas projeções elaboradas por especialistas do Eurosistema e do BCE (New procedure for constructing Eurosystem and ECB staff projection ranges), publicado em dezembro de 2009 e disponível (apenas em língua inglesa) no sítio do BCE.

O crescimento da remuneração por trabalhador deverá abrandar em 2020 e aumentar em 2021 e 2022, à medida que a atividade ganha ritmo e os mercados de trabalho permanecem restritivos. O crescimento da remuneração por trabalhador foi atenuado em 2019 pelo impacto da conversão de um crédito fiscal (CICE[6]) num corte permanente das contribuições patronais para a segurança social em França. O abrandamento da atividade económica contribuiu igualmente para o enfraquecimento do crescimento da remuneração por trabalhador no decurso de 2019. Embora se considere que a evolução económica mais fraca continua a pesar sobre o crescimento da remuneração por trabalhador em 2020, a retoma da atividade económica e a persistência de mercados de trabalho restritivos deverão contribuir para um maior crescimento da remuneração por trabalhador em 2021 e 2022.

De acordo com as projeções, o crescimento dos custos unitários do trabalho deverá diminuir até ao início de 2021 e apresentar um ligeiro reforço durante o restante horizonte de projeção. O perfil descendente do crescimento dos custos unitários do trabalho até ao início de 2021 é explicado pelo enfraquecimento do crescimento da remuneração por trabalhador, combinado com o reforço previsto do crescimento da produtividade do trabalho, à medida que o crescimento do PIB se fortalece gradualmente. Por conseguinte, a evolução globalmente horizontal do crescimento da produtividade do trabalho, a par dos aumentos previstos do crescimento da remuneração por trabalhador, implica um ligeiro reforço do crescimento dos custos unitários do trabalho no decurso de 2021 e 2022.

Após a compressão a que foram sujeitas nos dois últimos anos, as margens de lucro deverão recuperar ligeiramente em 2021 e 2022. O enfraquecimento cíclico da atividade económica, o aumento do crescimento dos salários e a evolução mais acentuada dos preços do petróleo em 2018 pesaram sobre a evolução das margens de lucro nos dois últimos anos. As melhorias da procura interna e externa deverão apoiar as margens de lucro em 2021 e 2022.

A expetativa é de que as pressões externas sobre os preços sejam fracas em 2020 e posteriormente se fortaleçam. Este perfil de evolução dos preços das importações é fortemente afetado pelos movimentos dos preços do petróleo, com a inclinação da curva dos preços dos futuros de petróleo a implicar uma taxa de crescimento negativa mais elevada em 2020, mas taxas negativas mais reduzidas em 2021 e 2022. A taxa de inflação positiva dos preços das importações durante o horizonte de projeção reflete também as pressões em sentido ascendente sobre os preços, tanto dos preços das matérias-primas não petrolíferas, como, de um modo mais geral, da evolução dos preços subjacentes a nível mundial.

Em comparação com a projeção de dezembro de 2019, as perspetivas para a inflação medida pelo IHPC não foram revistas durante o horizonte de projeção. Os efeitos em sentido descendente sobre a inflação global em 2020 decorrentes de pressupostos referentes a preços do petróleo mais baixos são globalmente compensados por pressupostos relativos a preços das matérias-primas alimentares mais elevados. A inflação medida pelo IHPC excluindo produtos energéticos e produtos alimentares permanece, em grande medida, inalterada em 2020, uma vez que o impacto da menor procura é amplamente compensado por alguns impactos em sentido ascendente esperados sobre os preços, devido a perturbações do lado da oferta resultantes da propagação da COVID-19. Para o resto do horizonte, a inflação não foi objeto de revisão.

3 Perspetivas orçamentais

Considera-se que a orientação orçamental da área do euro[7] será expansionista em 2020 e 2021 e, em geral, neutra em 2022. A projetada menor restritividade da orientação orçamental em 2020 e 2021 resulta sobretudo do aumento da despesa, em especial das transferências, bem como de cortes nos impostos diretos e nas contribuições para a segurança social. Projeta-se que, em 2022, a orientação orçamental se apresente globalmente neutra. Em comparação com as projeções de dezembro de 2019, espera-se que a orientação orçamental seja ligeiramente mais expansionista em 2020 e 2021[8].

Quanto ao saldo orçamental da área do euro, projeta-se que diminua de forma constante em 2020 e 2021 e estabilize em 2022, enquanto o rácio da dívida se mantém numa trajetória descendente. A diminuição do saldo orçamental decorre da orientação orçamental expansionista. Tal é parcialmente compensado pelas menores despesas com juros, ao passo que o contributo positivo da componente cíclica para o saldo orçamental diminui em 2020 e 2021. A dinâmica favorável do rácio da dívida pública ao longo do horizonte de projeção é impulsionada pelo diferencial favorável entre taxa de juro e taxa de crescimento. Em contrapartida, o apoio do saldo primário desvanece-se em 2021 e 2022, projetando-se que passe a ser negativo nesse período.

As projeções orçamentais de março de 2020 revelam défices orçamentais mais elevados de 2020 a 2022 do que o sinalizado nas projeções equivalentes no exercício de dezembro de 2019. Embora a avaliação do saldo orçamental relativo a 2019 se mantenha inalterada, o saldo para o período de 2020 a 2022 deverá ser significativamente inferior ao indicado no exercício de projeção de dezembro de 2019, devido a uma diminuição mais forte do saldo primário. Face ao excedente de 0,9% do PIB estimado para 2019, projeta-se que o saldo primário da área do euro registe um pequeno défice em 2021 e 2022, ao passo que, no exercício anterior, ainda apresentava um pequeno excedente até ao termo do horizonte de projeção. Esta revisão deve-se a uma orientação ligeiramente mais expansionista e a um agravamento da componente cíclica. Projeta-se que o rácio da dívida se mantenha numa trajetória mais elevada do que nas projeções de dezembro de 2019, em virtude também de um saldo primário mais reduzido.

Caixa 4
Previsões elaboradas por outras instituições

Estão disponíveis várias previsões para a área do euro elaboradas por organizações internacionais e instituições do setor privado. Todavia, essas previsões não são rigorosamente comparáveis entre si ou com as projeções macroeconómicas elaboradas por especialistas do BCE, dado que foram concluídas em momentos distintos. Baseiam-se igualmente em diferentes pressupostos sobre a propagação provável do vírus COVID-19. Além disso, estas projeções utilizam métodos diferentes (parcialmente não especificados) de cálculo dos pressupostos relativos às variáveis orçamentais, financeiras e externas, incluindo preços do petróleo e de outras matérias-primas. Por último, existem diferenças nos métodos de correção de dias úteis utilizados nas diversas previsões (ver o quadro).

As projeções dos especialistas para o crescimento real do PIB e para a inflação medida pelo IHPC estão globalmente dentro dos intervalos das previsões de outras instituições e de analistas do setor privado. As projeções relativas ao crescimento e à inflação em 2020 apresentam valores inferiores aos de outros analistas, com a exceção da OCDE, que foi a única instituição a publicar uma atualização (para o crescimento real do PIB) após a eclosão do surto de COVID-19 em Itália (em 2 de março).

Comparação de previsões para o crescimento real do PIB e para a inflação medida pelo IHPC na área do euro

(variação anual, em percentagem)

Fontes: Economic Outlook, da OCDE, de novembro de 2019 para o IHPC e de março de 2020 para o PIB; Barómetro da Zona Euro da MJEconomics, fevereiro de 2020; previsões da Consensus Economics, fevereiro de 2020; previsões económicas do inverno de 2020 da Comissão Europeia; inquérito do BCE a analistas profissionais relativo ao primeiro trimestre de 2020; World Economic Outlook, do FMI, de outubro de 2019 para o IHPC e de janeiro de 2020 para o PIB.
Notas: As projeções macroeconómicas dos especialistas do BCE e as previsões da OCDE apresentam taxas de crescimento anuais corrigidas de dias úteis, ao passo que a Comissão Europeia e o FMI apresentam taxas de crescimento anuais não corrigidas de dias úteis por ano. As restantes previsões não especificam se foram ou não utilizados dados corrigidos de dias úteis.

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Para uma definição da terminologia específica, consultar o Glossário do BCE (disponível apenas em língua inglesa).


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  1. A data de fecho relativa a pressupostos técnicos, como os preços do petróleo e as taxas de câmbio, foi 18 de fevereiro de 2020 (ver a caixa 1). As projeções macroeconómicas para a área do euro foram concluídas em 28 de fevereiro de 2020.O exercício de projeção macroeconómica atual abrange o período de 2020 a 2022. Projeções com um horizonte tão alargado estão sujeitas a uma incerteza muito elevada, facto que é necessário ter em conta na sua interpretação. Ver o artigo dedicado a uma avaliação das projeções macroeconómicas elaboradas por especialistas do Eurosistema (An assessment of Eurosystem staff macroeconomic projections), publicado na edição de maio de 2013 (não disponível em língua portuguesa) do Boletim Mensal do BCE. Para uma versão acessível dos dados subjacentes aos quadros e gráficos selecionados, consultar http://www.ecb.europa.eu/pub/projections/html/index.en.html (página disponível apenas em língua inglesa).
  2. O pressuposto relativo às taxas de rendibilidade nominais das obrigações de dívida pública a dez anos da área do euro tem por base a média ponderada das taxas de rendibilidade das obrigações de dívida pública a dez anos de referência dos países, ponderada em função dos valores anuais do PIB e alargada pela trajetória a prazo obtida a partir da taxa de cupão do BCE que torna o preço da obrigação igual ao valor nominal (par yield) a dez anos de todas as obrigações da área do euro, sendo a discrepância inicial entre as duas séries mantida constante ao longo do horizonte de projeção. Quanto aos diferenciais entre as taxas de rendibilidade das obrigações de dívida pública específicas dos países e a média da área do euro correspondente, pressupõe-se que permaneçam constantes durante o horizonte de projeção.
  3. Ver, por exemplo, IRC Trade Task Force, “Understanding the weakness in global trade – What is the new normal?”, Série de Documentos de Trabalho Ocasionais, n.º 178, BCE, setembro de 2016.
  4. A média entre 1999 e 2007.
  5. Ver Coenen, G. et al. “The New Area-Wide Model II: an extended version of the ECB’s micro-founded model for forecasting and policy analysis with a financial sector”, Documento de trabalho n.º 2200 do BCE, novembro de 2018, e Angelini, E. et al. “Introducing ECB-BASE: The blueprint of the new ECB semi-structural model for the euro area”, Documento de trabalho n.º 2315 do BCE, setembro de 2019.
  6. Dado que a diminuição da remuneração por trabalhador e dos custos unitários do trabalho relacionada com o CICE (crédit d’impôt pour la compétitivité et l’emploi/crédito fiscal para a competitividade e o emprego) é, em grande medida, compensada por um aumento correspondente das margens de lucro, espera-se que o impacto na fixação dos preços seja limitado.
  7. A orientação da política orçamental é medida como a variação do saldo primário corrigido do ciclo líquido do apoio estatal ao setor financeiro.
  8. Os pressupostos orçamentais incorporados nas projeções de março de 2020 não incluem as medidas em resposta ao surto de COVID-19 que foram anunciadas em Itália e em vários outros países da área do euro desde 28 de fevereiro.